
Havia um rapaz cheio de vida, com ares de domínio sobre as razões e as paixões. Cheguei a conhecê-lo! Era de um tipo físico bonito, com feições sóbrias. Quando falava demonstrava o dom da palavra chamando a atenção dos seus ouvintes. Era capaz de realizar tarefas variadas como se cada uma fosse uma simples atividade de seu cotidiano. Quando fazia questionamentos, fundamentava bem sua posição permitindo transparecer os seus diversos conhecimentos. Tinha tantos talentos que chegava a incomodar os mais orgulhosos, o que, por outro lado, encantava os mais humildes.
Com capacidade de arregimentar as pessoas mais simples devido à sua filosofia de vida, sociável e acessível, não temia contrariar os costumes de seu grupo chegando até a ignorar práticas tidas como comuns de relacionamento social. Ao contrário da maioria de sua sociedade, prestava-se a conversar e ouvir pessoas tidas como fracassadas ou sem futuro. Sua bandeira era o respeito e o reconhecimento do outro em função de uma causa maior, nem que todos os paradigmas tivessem que ser quebrados. E era o que ele fazia, quebrava paradigmas com maestria.
Lançava questionamentos e soluções até então impensados, era um verdadeiro louco, não se incomodava em arrancar as pessoas do comodismo, do lugar comum, da cristalização do pensamento. Tinha uma força e originalidade de idéias que ultrapassava à criatividade mediana fazendo pressupor um conhecimento de causa. Sempre que o encontrava enchia-me de júbilo por ter a possibilidade de usufruir o benefício de sua presença.
Creio que o que mais se destacava era a sua capacidade de comunicação com as pessoas, pois as palavras ditas de forma simples eram entendidas pelos diversos tipos de inteligências com a capacidade de despertar medo e alegria, inveja e encanto.
Tanto que encontrei várias pessoas que levaram um solavanco nos seus conceitos tendo que rever suas “verdades”. Tiveram seus mundinhos contrariados e, dispostos a deter tamanha liberdade, afinal, para essas pessoas, quem era esse jovem metido a inteligente para atrapalhar os velhos costumes e as velhas crenças do povo, já imaginou um futuro líder sem a necessidade de uma máquina política ou um aparato administrativo, e eles, como ficariam? Segundo a vontade deles, é melhor ele sumir do que terem que mudar suas posições.
Não compactuei com o que planejaram e, confesso, tive medo de demovê-los da decisão de desmoralizá-lo, afinal, era um grupo que detinha o poder de decisão. Acho que fiquei temeroso de ser confundido como um simpatizante daquele jovem, mesmo sendo verdade essa simpatia. Nesse momento, tremi e pedi a Deus que nos ajudasse. Não presenciei o que planejaram, mas vi o desfecho do plano.
A primeira coisa foi fazer com que ele fosse confundido com os fora-da-lei acusando-o de ladrão. Chamaram a polícia e indicaram o rapaz afirmando que ele tinha roubado uma senhora. O moço tentando explicar-se foi pego de súbito pelo policial que torceu seu braço e o imobilizou. Rapidamente chegou outro policial que lhe deu um tapa no rosto fazendo-o cair no chão. Nesse momento, chorei com outras pessoas por estarmos aterrorizados diante de tamanha violência e injustiça.
No chão, ainda levou alguns chutes, causando-lhe ferimentos profundos no rosto o que fez o local ficar ensangüentado. Houve muitos gritos e pedidos de calma enquanto, por um breve momento, percebi o regozijo de algumas pessoas do grupo incomodado.
Foi quando, num minuto de equilíbrio, o jovem tentou enfiar a mão no bolso para virá-lo e provar que não tinha nada de ninguém. Nesse momento o policial viu a ação do jovem e não titubeou, atirou no seu peito três vezes, enquanto ainda estava no chão, sangrando, tonto e, agora, morto. Foi a última vez que o vi.
Todos nós choramos, gritamos, mas já não havia o que fazer. O plano de tirá-lo do caminho atingira o seu escopo. Estava morto um rapaz brilhante e de futuro abençoado cuja bênção se estendia a todos nós. Chamava-se Pedro e me fez relacionar, por causa do nome, a outra pessoa injustiçada e morta pela raiva invejosa dos medíocres: Jesus Cristo.
Tudo isso me fez refletir. Afinal, quantas vezes, em um grau maior ou menor, nós já “crucificamos Jesus” através da nossa rejeição a pessoas talentosas devido ao nosso medo, orgulho e inveja?
Outra: considerando a superioridade dos talentos de Cristo, se Ele chegasse hoje, nós estaríamos preparados para reconhecê-lo e aceitá-lo ou preferiríamos ficar no nosso mundinho fazendo-o ser crucificado novamente?
Agora percebo claramente o que se passou há dois mil anos!
E isso me fez acreditar ter podido penetrar um pouco no discurso de salvação proclamado por Cristo, contudo, de uma forma diferente da percepção religiosa a qual remete à condição do intangível ou sobrenatural. Ao contrário, percebi que ela é concreta e se realiza a cada instante através de nossas escolhas. A salvação chega quando conseguimos aceitar e estimular as transformações externas o que, por incrível que pareça, o alvo acaba sendo o nosso íntimo.
A minha resposta eu já tenho e apenas posso partilhar sobre o que aprendi. Quando perdemos a capacidade de júbilo diante de pessoas com talentos alheios a nós, é sinal de algo estranho dominando nossos desejos que nos impede de nos libertar de nós mesmos, ou seja, de ver a luz.
Copyright©Mhauro Garcia Filho-2005
Mhauro, muita coisa mudou p'ra pior. Nossa sociedade prefere o "homem sublime" ao "superhomem" (fig., Nietzsche), ainda mais porque, no caso específico dos alencarinos, a mediocridade é um talento a ser preservado (por força de motivos sócio-econômicos)... Triste ter que falar assim, dessa forma, até mesmo porque sou alencarino. Já fomos grandiosos? Não, nunca fomos grandiosos, até mesmo porque nossos talentos sempre foram individuais. Esta terra já teve seus grandes homens, mas a seifa bruta e selvagem impede que, hoje, possamos dar vazão à nossa criatividade e espírito de luta (contra as adversidades de toda sorte). Esta "colheita antecipada", que poderia ser muito bem chamada de "Nova catequese do sec. XXI", elimina, marginaliza, escraviza nossos novos talentos, em nome de uma nova ordem valorativa, seja daquela que prega o "culto à bunda" (das inúmeras boquinhas da garrafa às éguinhas pokotós), seja daquela que, pela conduta engarrafada e distribuída via ondas de rádio ou banda digital, massifica e impõe, por via do imperialismo cultural, valores que não tínhamos no passado.
ResponderExcluirCompartilho sua dor. C.M.C., A.T.P.
Mauro,
ResponderExcluirSeu blogger é com você e sua forma de agir e ver o mundo, com sensibilidade, clareza e sensatez.
Seria muito bom se todos utilizassem as invenções tecnológicas para algo realmente importante e bom.
Você é uma pessoa muito especial, mantenha seu coração sempre assim, nunca deixe que esse mundo repleto de pessoas medíocres o enfraqueçam.
Te admiro muito e guardo por você um carinho especial.
Beijo grande e que Deus te abençõe,
Renata
Lendo o artigo, acredito na sabedoria e equilibrio.Há solução . É seguir enfrente sem olhar pra traz , crecer cada dia mais .
ResponderExcluirUma pessoa como VC incomoda muita gente , ser culto ,inteligente ,guerreiro,vencedor é previlegio de quem tem alma limpa e coração puro.Te olha no espelho , te veja por fora e por dentro, é especial impar. Injustiça , inveja dos bonachões mediocres levaram Jesus Cristo ao sofrimento. Só que hoje no mundo moderno que os conceitos passados são caretas . E o que vemos é um mundo cheio de Jesus Cristo injustiçados .
São Bento te guarde te ilumine hoje e sempre .
Obrigada por VC existir . Com carinho beijos de luz no teu coração.